quinta-feira, 31 de julho de 2008

Tempos modernos

As pessoas tem preguiça de ler textos longos. Estava esperando um "hoje em dia" completando a frase anterior, não é? Não sei se é verdadeiro encaixar um "as pessoas" junto com um "hoje em dia" nesse caso. Se formos tomar como base a maioria da população mundial, as pessoas por muito tempo mal souberam ler. Ou mal sabem... Quem dirá ter paciência para ler textos longos.

Então, não acho que hoje em dia elas tenham ficado com preguiça de ler textos que se estendem por mais do que uns poucos e curtos parágrafos. Acho que hoje em dia, e aqui sim cabe um "hoje em dia", as pessoas(esse termo genérico que define um universo heterogêneo de forma tão homogênea) lêem uma quantidade muito maior de textos. O tempo todo. Tecla batida e rebatida. A era da informação. E com um universo maior de pessoas lendo, lendo e lendo, é natural que apareça em destaque essa maioria de pessoas que de fato tem preguiça de ler textos longos. Eu também tenho. Por isso talvez seja melhor terminar por aqui. Antes que você desista de ler esse parágrafo até o fim. Tudo isso porque me ocorreu que quase ninguém vai ler esse texto aí em baixo. Porque daqui não dá pra ver o final dele.

Não ganhei na mega-sena, de novo


O nível de felicidade de uma pessoa permanece basicamente o mesmo ao longo de toda a vida. Uma pessoa que é feliz por natureza tende a manter essa característica mesmo que passe por algum trauma que venha a lhe roubar a alegria temporariamente. Como um otimista que de repente se vê em uma cadeira de rodas. Depois de uma fase de tristeza, ele provavelmente será uma pessoa feliz em uma cadeira de rodas. Já uma pessoa que tem uma atitude negativa diante da vida vai ser infeliz pelo resto dela. Mesmo que algo de muito bom aconteça(como ganhar na loteria), depois de passada a euforia ela tende a voltar a ser a mesma mal-humorada e depressiva pessoa de sempre. Ainda que milionária.

Não sei ao certo quantas pesquisas abordam o assunto, mas já vem de longe o dia em que ouvi falar disso a primeira vez. Provavelmente foi naquele filme/desenho "Waking Life", do diretor Richard Linklater, em que os personagens de um sonho apenas conversam e conversam sobre idéias e filosofia. O parágrafo acima, inclusive, é basicamente a memória que tenho da cena em que o assunto era abordado. Uma conversa de cama entre o Ethan Hawke redesenhado e uma moça escondida pela metade, debaixo do lençol.

Já a última vez que vi o assunto ser trazido à tona lembro bem quando foi. Era um estudo divulgado em um jornal alemão de economia(!) - li numa matéria do Globon, não leio jornais alemães.. - que dizia que perder o emprego era mais traumático do que ficar viúvo. Para chegar à conclusão os pesquisadores se basearam em entrevistas nas quais mediam os níveis de felicidade das pessoas durante algum tempo. Dessa forma descobriram que quem fica desempregado demora mais para voltar ao nível de felicidade que tinha antes de perder o emprego, do que uma pessoa que passou pelo trauma de perder o cônjuge. A matéria lembrava que havia outros estudos que apontavam que a felicidade podia ser genética, um traço de personalidade. Ainda lembro bem que o nome dado pelos brilhantes cientistas ao "fenômeno" que explicava as pessoas voltarem a um nível de felicidade médio algum tempo depois de um trauma ou de uma grande alegria era "adaptação". Adequado, mas não precisava ser cientista para dar esse nome ao dito fenômeno.

Tanta enrolação pra confessar que a constatação me assustou. Quer dizer que mesmo que eu tivesse acertado aqueles seis números mágicos que acabariam com meus problemas, eu iria continuar a ser o mesmo infeliz, instável e às vezes depressivo que sempre fui? Não sei que nível de felicidade você se daria com sinceridade, caso fosse indagado por um desses cientistas, mas para alguém que não se considera a pessoa mais radiante do mundo é duro pensar que se está condenado a não encontrar a tal felicidade nunca. Gostaria de perguntar aos cientistas, "ficar rico não vai me fazer feliz então?". "Temporariamente", eles responderiam. "E encontrar a mulher da minha vida?". "Você se acostuma. Cansa, e vêm as outras mulheres da vida". "Ter um filho?". O cientista ri antes de responder. "Essa tá na matéria, né? Depois de uns dois anos o nível de felicidade volta ao normal. Isso se o tal moleque vier numa hora em que ele seja mesmo motivo de felicidade. Nem sempre é assim, bem se sabe. Poucos pais ou mães vão dizer que os filhos não os fazem felizes. Mas o tempo todo?". "Ok. A pergunta foi tola."

E aonde chegamos com essas pesquisas? À idéia de que a felicidade é química, genética, e que qualquer problema pode ser resolvido com uma ida ao psiquiatra e uma receita? Porque saber que se está condenado a ser um melancólico pelo resto da vida é um golpe duro. Acho que não é essa a resposta. E é claro que não existe uma apenas. Sempre desconfiei de pesquisas, mas tenho que confessar que essas fazem algum sentido se você parar para observar as pessoas por algum tempo. Quando escrevo sobre pesquisas evito dizer que elas provam qualquer coisa. Em geral digo que elas apontam ou indicam. É o que a maioria faz. E como não pretendo fazer aqui um texto de auto-ajuda, ou de ajuda-ao-próximo, apenas aponto uma conclusão. Não posso aceitar que estejamos condenados a ser os mesmos para sempre, sem nunca alcançar essa abstração que criamos de felicidade. Mas também não sou tão idiota a ponto de achar que realmente alguns milhões fariam a alegria eterna. Acho que realmente temos uma tendência a uma atitude positiva ou negativa diante da vida de uma maneira geral. Com seus altos e baixos influenciados por fatores externos, alterações hormonais e etceteras. Mas podemos mudar e ser mais felizes tendo consciência disso e procurando mudar as atitudes diantes da vida quando necessário. Mudar a maneira de encará-la. É duro escrever tudo isso para terminar em um clichê, mas descobri que existe um motivo para que alguns pensamentos sejam tão repetidos a ponto de se transformarem em um. Enfim... Queria ter ganhado na mega-sena...